quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Prefiro o vermelho, obrigado!

Alarga-se o debate, salvo entre os fundamentalistas de mercado, sobre as incompatibilidades entre a democracia e o sistema financeiro, entre o poder do voto e o poder do dinheiro.
Se aos mercados nos queremos dirigir não temos morada, nem telefone, nem mail, nem fax, nem coisa alguma. Não existem responsáveis pelas desgraças perpetradas pelo funcionamento dos mercados. É intrigante ver os apologistas do neoliberalismo, que por norma nunca dizem que o são e fingem não perceber o que isso é para, hipocritamente, mascararem as suas opções políticas por supostas evidências e inevitabilidades, argumentarem as virtudes do mercado de possibilitar à sociedade civil intervir activamente nos processos da economia. Será que eles acreditam mesmo que o mercado livre, tal como idealizado por Adam Smith, é exequível? Se sim, acreditarão no pai natal? E no super homem?
Como sempre acontece num mercado livre, a concorrência esgota-se num ápice face ao apetite de uns vampiros que vivem entre nós. Pode ser livre durante uns tempos mas depois disso grandes fatias de quotas de mercado já estão a fazer as delícias aos paladares desses vampiros.
Não vejo no Estado o papá que resolve tudo e que põe os vampiros na ordem, até porque muitos deles andam por lá para se certificarem que o poder não seja influenciado por movimentos progressistas. Mas basta ter um pingo de cultura histórica para saber que o excesso de liberalismo económico gera autênticos desequilíbrios e instabilidades sociais, como nos demonstram os séculos XIX (“ ordem liberal britânica”), XX ( 1929) e XXI (2008). Não defendo uma plena intervenção estatal que também já demonstrou diversas vezes dar para o torto mas estou inteiramente convicto do papel central que o Estado deve ter na economia. Aliás, quem sabe da importância dos Tratados de Vestefália, sabe da importância que a organização dos Estados modernos teve para o progresso da condição humana.
Adam Smith falava da livre concorrência. Utopia? Será, pelo menos, para determinados mercados. Veja a probabilidade de a marca do software do seu computador ser a mesma da de um computador de um cidadão marroquino e perceberá que a livre concorrência é uma realidade bastante limitada.
Não abdico da defesa de um Estado forte porque confio mais numa organização de cariz democrático do que numa organização de caris mafioso e lobista. E, se um dia, transferirem o poder do Estado para algum lado não será para os mercados mas para comunidades autónomas, livres das secantes e, por vezes, paralisantes burocracias estatais e dos dentes afiados da escumalha vampiresca.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

José Afonso

25 anos após a morte de um ilustre camarada progressista, eles continuam a comer tudo e a não deixar nada, e continua a fazer falta animar a malta!
Obrigado Zeca, continuas a inspirar e a levantar as cabeças progressistas.
25 de Abril Sempre!!!!

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Jacques Amaury, sociólogo e filósofo francês, escreve sobre Portugal

Portugal atravessa um dos momentos mais difíceis da sua história que terá que resolver com urgência, sob o perigo de deflagrar crescentes tensões e consequentes convulsões sociais.
Importa em primeiro lugar averiguar as causas. Devem-se sobretudo à má aplicação dos dinheiros emprestados pela UE para o esforço de adesão e  adaptação às exigências da união.
Foi o país onde mais a UE investiu "per capita" e o que menos proveito retirou. Não se atualizou, não melhorou as classes laborais, regrediu na qualidade da educação, vendeu ou privatizou mesmo atividades primordiais e património que poderiam hoje ser um sustentáculo. Os dinheiros foram encaminhados para autoestradas, estádios de futebol, constituição de centenas de instituições público-privadas, fundações e institutos, de duvidosa utilidade, auxílios financeiros a empresas que os reverteram em seu exclusivo benefício, pagamento a  agricultores para deixarem os campos e aos pescadores para venderem as embarcações, apoios estrategicamente endereçados a elementos ou a próximos deles, nos principais partidos, elevados vencimentos nas classes superiores da administração pública, o tácito desinteresse da  Justiça, frente à corrupção galopante e um desinteresse quase total das Finanças no que respeita à cobrança na riqueza, na Banca, na  especulação, nos grandes negócios, desenvolvendo, em contrário, uma atenção especialmente persecutória junto dos pequenos comerciantes e população mais pobre.
A política lusa é um campo escorregadio onde os mais hábeis e corajosos penetram, já que os partidos cada vez mais desacreditados, funcionam essencialmente como agências de emprego que admitem os mais corruptos e incapazes, permitindo que com as alterações governativas permaneçam, transformando-se num enorme peso bruto e parasitário.
Assim, a monstruosa Função Publica, ao lado da classe dos professores, assessoradas por sindicatos aguerridos, de umas Forças Armadas dispendiosas e caducas, tornaram-se não uma solução, mas um factor de peso nos problemas do país.
Não existe partido de centro já que as diferenças são apenas de retórica, entre o PS (Partido Socialista) e o PSD (Partido Social Democrata), de direita, agora mais conservador ainda, com a inclusão de um novo líder, que tem um suporte estratégico no PR e no tecido empresarial abastado. Mais à direita, o CDS (Partido Popular), com uma atividade assinalável, mas com telhados de vidro e linguagem publica, diametralmente oposta ao que os seus princípios recomendam e praticarão na primeira oportunidade. À esquerda, o BE (Bloco de Esquerda), com tantos adeptos como o anterior, mas igualmente com uma linguagem difícil de se encaixar nas recomendações ao Governo, que manifesta um horror atávico à esquerda, tal como a população em geral, laboriosamente formatada para o mesmo receio. Mais à esquerda, o PC (Partido comunista) menosprezado pela comunicação social, que o coloca sempre como um perigo latente e uma extensão inspirada na União Soviética, oportunamente extinta, e portanto longe das realidades atuais.
Assim, não se encontrando forças capazes de alterar o status, parece que a democracia pré-fabricada não encontra novos instrumentos.
Contudo, na génese deste beco sem aparente saída, está a impreparação, ou melhor, a ignorância de uma população deixada ao abandono, nesse fulcral e determinante especto. Mal preparada nos bancos das escolas, no secundário e nas faculdades, não tem capacidade de decisão, a não ser a que lhe é oferecida pelos órgãos de Comunicação. Ora e aqui está o grande problema deste pequeno país; as TVs as Rádios e os Jornais, são na sua totalidade, pertença de privados ligados à alta finança, à industria e comercio, à banca e com infiltrações acionistas de vários países.
Ora, é bem de ver que com este caldo, não se pode cozinhar uma alimentação saudável, mas apenas os pratos que o "chefe" recomenda.
Daí a estagnação que tem sido cómoda para a crescente distância entre ricos e pobres.
A RTP, a estação que agora engloba a Rádio e TV oficiais, está dominada por elementos dos dois partidos principais, com notório assento dos sociais-democratas, especialistas em silenciar posições esclarecedoras e calar quem levanta o mínimo problema ou dúvida. A
seleção dos gestores, dos diretores e dos principais jornalistas é feita exclusivamente por via partidária. Os jovens jornalistas, são condicionados pelos problemas já descritos e ainda pelos contratos a prazo determinantes para o posto de trabalho enquanto, o afastamento dos jornalistas seniores, a quem é mais difícil formatar o processo a pôr em prática, está a chegar ao fim. A deserção destes, foi notória.
Não há um único meio ao alcance das pessoas mais esclarecidas e por isso, "non gratas" pelo establishment, onde possam dar luz a novas ideias e à realidade do seu país, envolto no conveniente manto diáfano que apenas deixa ver os vendedores de ideias já feitas e as cenas
recomendáveis para a manutenção da sensação de liberdade e da prática da apregoada democracia.
Só uma comunicação não vendida e alienante, pode ajudar a população, a fugir da banca, o cancro endémico de que padece, a exigir uma justiça mais célere e justa, umas finanças atentas e cumpridoras, enfim, a ganhar consciência e lucidez sobre os seus desígnios.

Jacques Amaury
Professor na Universidade de Estrasburgo

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Às vezes

Às vezes olhamos e só vemos diferença.  Às vezes olhamos e só vemos igualdade. Às vezes, quando olhamos para a diferença, apercebemo-nos do quão importante ela é, porque sem ela a vida seria a preto e branco, monótona e entediante. Às vezes, quando olhamos para a igualdade, sentimo-nos em harmonia com o espaço que nos rodeia, sentimos a força espiritual de um ser gregário. Outras vezes, quando olhamos para a diferença, sentimo-nos esmagados pela imensa injustiça com que nos deparamos e arrefecidos no calor das relações humanas. Outras vezes, quando olhamos para a igualdade, ficamos atordoados porque surpreendidos por uma grande pancada. Afinal, como desenvolveu Carlo M. Cipolla no seu livro “Allegro ma nom troppo”, existem muitas mais pessoas estúpidas do que aquilo que pensamos.