quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Ska P A la mierda+Animales de Laboratorio

Transformação - Zine - Dias de Guerra, Noites de Amor - Extratos

Se o conhecimento acumulado da civilização ocidental tem algo de valor para nos oferecer hoje, é uma consciência das diversas possibilidades quando pensamos na vida humana. Os historiadores, sociólogos e antropologos, podem pelo menos nos mostrar uma coisa: que os seres humanos viveram em milhares de diferentes tipos de sociedade, com dezenas de milhares de códigos e valores diferentes, dezenas de milhares de relações entre pessoas e com o mundo que as cerca, dezenas de milhares de conceitos e maneiras de ser. Viajando um pouco podemos chegar às mesmas conclusões, isso se não chegares lá depois da Coca-Cola :) e não passar a viagem trancado numa porcaria de albergue num clima de pseudo-reality-show.

É por isso que não consigo deixar de rir quando alguém diz algo a respeito da "natureza humana", referindo-se a alguma fatal e imutável característica humana ou suposto destino. Já pararam para pensar que temos um ancestral em comum com os ouriços-do-mar?! Que a regra é a mudança e adaptação para onde quer que se olhe?! Se ambientes diferentes podem tornar esses primos distantes tão diferentes de nós, o que se pode dizer do que podemos nós tornar-nos se mudarmos as nossas intenções, se permitirmos a nós mesmos viver num ambiente libertário, diferente desse pesadelo de competição e consumo capitalista?! Se existe algo em falta (e muita gente admite que falta muita coisa) nas nossas vidas, se há algo tão desnecessariamente trágico e sem sentido nas nossas trajectórias, existem também lugares e meios onde a felicidade ainda não foi procurada, que permanecem inexplorados. Então o que precisa ser feito talvez seja modificar estes espaços e ambientes para melhor. "Se queres mudar o mundo, precisas antes de mudar-te a ti mesmo", é isso que diz o ditado. Pois bem, aprendemos que esta relação é reciproca , e que ao contrário também.

Há ainda outra descoberta valiosa alcançada pela nossa espécie, ainda que tenhamos aprendido isto por um caminho bem doloroso: somos capazes de transformar completamente os ambientes. O lugar onde tu te deitas, sentas ou ficas de pé lendo este texto, provavelmente era completamente diferente há menos de uma centena de anos, para não dizer há dois mil anos, e praticamente todas essas mudanças foram feitas por seres humanos. Nós refizemos completamente o nosso mundo nos últimos séculos, transformando as condições de vida de quase todo tipo de planta ou animal, acima de tudo de nós mesmos. Só nos resta experimentar (ou não) essas mudanças intencionalmente, de acordo com as nossas necessidades ao invés de realiza-las segundo forças irracionais, desumanas, como competição, superstição, rotina.

Depois de nos darmos conta disso, poderemos lutar por um novo destino para nós mesmos, tanto individualmente como colectivamente. Não seremos mais atirados de um lado para o outro por forças que supostamente estão fora do nosso controle; ao invés disso, nesta viagem de auto-conhecimento através da criação de novos ambientes, descobriremos tudo aquilo que podemos ser. Este vai nos levar para fora do mundo que conhecemos, muito além dos horizontes mais distantes que podemos ver de onde estamos. Tornaremos-nos os maiores artistas e a nossa maior obra.

Para conseguir isto, vamos precisar aprender coisas difíceis, porém gratificantes, coexistir com a diferença sempre que ela não seja hierárquica, colaborar com outras pessoas na busca do êxito: só assim perceberemos o quão indissociáveis são as nossas vidas, só essa percepção pode permitir-nos ter outro horizonte. Até que a mudança se torne possível e quotidiana, não nos será negado o nosso potencial nem o dos nossos companheiros, porque o mundo que nos faz e no qual temos que viver é fruto da vontade e do esforço de todos.

Aquilo que também nos falta é o conhecimento dos nossos próprios desejos. Desejos são coisas escorregadias, mutáveis e difíceis de se concretizar, quanto mais de acompanhar. Se vamos ter como objectivo a busca e transformação dos nossos desejos e vontades, devemos antes de tudo encontrar maneiras de descobri-los e liberta-los. Se assim for, nenhuma experiência ou aventura será jamais suficiente, todas elas serão complementares. Portanto os criadores deste novo mundo deverão ser mais generosos e mais gananciosos que todos os que os antecederam: mais generosos uns com os outros, e mais gananciosos pela vida!